Historicamente um povo empreendedor, o catarinense tem buscado formas de se reinventar durante a pandemia de Covid-19. Essa reinvenção passa pelos mais variados aspectos da vida cotidiana: vai desde o aspecto social, com a necessidade do distanciamento para evitar a propagação do vírus, até o mercado corporativo, com a busca de modelos de negócio que se adaptem à nova realidade.
Nos mais diversos setores econômicos, a renovação de processos e de busca por clientes tem sido contínua. Especialistas afirmam que muitas das mudanças provocadas pelo novo coronavírus vieram para ficar, o que ressalta a necessidade de um aperfeiçoamento constante. Uma das áreas que buscou se antecipar a essa tendência foi a indústria. O setor apresentou ao Governo do Estado, por meio de sua federação (Fiesc), o Projeto Travessia, que atuará em quatro frentes: reinvenção da indústria e da economia, investimento em infraestrutura, atração de capital e pacto institucional.
Umas das maiores empresas catarinenses, a WEG é um exemplo de companhia que modificou processos – e por uma causa nobre. Especializada na produção de motores elétricos, a empresa, com sede em Jaraguá do Sul, atendeu a um chamado dos governos federal e estadual para produzir respiradores pulmonares, equipamento essencial para as Unidades de Terapia Intensiva (UTI), local para onde se encaminham os casos graves de insuficiência respiratória causada pela Covid-19.
O primeiro contato da empresa com a administração estadual ocorreu ainda em março, porém a confirmação de que a produção seria possível ocorreu no dia 12 de maio. Desde então, uma operação de guerra foi montada para garantir a produção dos respiradores. Ao todo, 500 deles foram entregues ao Governo do Estado. Para o Ministério da Saúde, a encomenda foi de 950 respiradores, totalizando 1.450 unidades.
Segundo o diretor superintendente da WEG Automação, Mafred Peter Johann, a confirmação da produção dependia da disponibilidade de componentes importados, que estavam escassos no mercado mundial. Ele conta que as dificuldades foram maximizadas quando a empresa decidiu assumir a produção de alguns desses componentes. Ao todo, cinco unidades de diferentes fábricas precisaram ser adaptadas para a produção dos ventiladores. Foram necessárias mudanças nos setores de ferramentaria, injeção de plástico, fabricação de placas eletrônicas, serralheria e montagem de equipamentos eletro-mecânicos.
"Ao final, ainda criamos uma área exclusiva que abriga a linha de montagem e testes finais dos ventiladores. A proposta de fabricação com transferência de tecnologia foi submetida à Anvisa, de quem recebemos a autorização. Em paralelo, estamos realizando todo o processo de certificação eletromédica do Inmetro. Envolvemos mais de 100 colaboradores, de diferentes áreas, na operação. Trabalhamos dia e noite, inclusive aos fins de semana, para alcançar o objetivo", afirma Johann.
A cidade de Luzerna, no Meio-Oeste catarinense, é o lar de uma pequena empresa formada por dois jovens engenheiros autônomos. A Optimum Engenharia nasceu em 2018 e contou com o apoio do Governo do Estado por meio do programa Sinapse da Inovação, desenvolvido pela Fapesc. Além de um aporte financeiro para a estruturação da empresa, os dois sócios também tiveram apoio com cursos e mentorias.
Até o início da pandemia, a empresa estava focada no setor de car tech – criação de ferramentas tecnológicas para automóveis. A principal aposta era o desenvolvimento de um sensor de estacionamento, que auxiliaria o motorista por meio de mensagens de voz na hora de colocar o carro na vaga desejada.
Com o avanço da Covid-19 e o enfraquecimento momentâneo do setor automotivo, os engenheiros pensaram em produzir algo que ajudasse no combate à doença. A primeira ideia, conta Luan Cizeski de Lorenzi, um dos fundadores da Optimum, foi a de criar um colar multissensorial para ajudar na identificação de casos suspeitos. Como o tempo de desenvolvimento seria longo demais, eles decidiram simplificar o projeto com a criação de um sensor automático para medir a temperatura de pessoas que adentrem a determinado ambiente. Ele poderá ser instalado em um totem, por exemplo, sem que um funcionário precise se expor a riscos de contágio ao medir a temperatura dos clientes com um termômetro.
"Nossa ideia é de automatizar esse processo, a fim de evitar riscos de contágio, além de identificar mais facilmente os casos de sobretemperatura, que é um dos sintomas da Covid-19. A pessoa se colocará diante do totem e o sensor, colocado na altura da têmpora, medirá a sua temperatura de maneira automática, Ao todo, foram quase três meses de desenvolvimento, mas agora o produto já está pronto e deve ser lançado ao mercado em breve", conta Lorenzi.
Os engenheiros pretendem comercializar o produto com estabelecimentos como hospitais, escolas e universidades, com uma capacidade de produção será de 10 a 15 unidades por mês.
Foto: Divulgação / Convenix
O Convenix é uma empresa de Joinville que tradicionalmente mantém relações de negócio com o setor do comércio varejista e suas lojas físicas. O principal serviço oferecido é um aplicativo de convênios que usa o débito em folha. Com os decretos de março para promover o isolamento social em Santa Catarina, o fundador da empresa, Felipe Corrêa da Silva, viu a necessidade de criar novas opções de mercado.
"No início da pandemia, nós nos assustamos bastante, pois dependíamos de uma interação mais física. Nossa base de usuários iria cair com as demissões no varejo. Então decidimos implementar três novas opções. Acredito que a inovação é uma palavra chave para o varejo nesse momento, pois tudo está mudando. A experiência de consumo vai se pautar também por novos canais de venda", opina Silva.
O portfólio do Convenix ganhou três novos produtos com a pandemia. O primeiro deles foi a criação de uma loja dentro do aplicativo. Com isso, os consumidores podem fazer as suas compras direto por esse canal e recebê-las em sua casa ou empresa, evitando a necessidade de deslocamento. A segunda opção disponibilizada após a pandemia foi a possibilidade de fazer os pagamentos pelo aplicativo por meio de um QR Code, evitando o uso do cartão de crédito e diminuindo os riscos de contágio.
Por fim, Silva afirma que a principal mudança ocorreu pelo fato de a empresa passar a atender também Organizações Não Governamentais (ONGs). As operações ocorrem da seguinte maneira: as ONGs recebem as doações e muitas vezes não tinham como operacionalizar as entregas. Por meio do aplicativo do Convenix e de uma rede conveniada de farmácias e mercados, a ONG repassa um crédito diretamente para a pessoa beneficiada, que usa o aplicativo para comprar as suas necessidades.
"Já atendemos mais de 500 famílias. A ONG fecha conosco e não precisa mais entregar as cestas básicas. Tivemos de mudar a operação inteira da empresa. Antes o nosso foco eram empresas privadas com mais de 100 funcionários. Esse processo facilita para a ONG e também para quem recebe", destaca Silva.